Quantum (“quântica”, em Latim) é fruto de uma residência de três meses do coreógrafo suíço Gilles Jobin e de sua companhia no maior laboratório de física de partículas do mundo, CERN, em Genebra, Suíça. A física de partículas trabalha com as interações mais básicas da natureza, partículas ainda menores do que o átomo. Numa escala tão diminuta, os físicos colidem as partículas, fazendo com que se quebrem em pedaços ainda menores, e se recombinem entre si, gerando muitas vezes novas partículas diferentes das originais.
Foi a partir desse princípio que Jobin se inspirou. Pensando em campos magnéticos, como ímãs com polos iguais que se repelem, Jobin trabalhou com corpos que se mantêm juntos sem necessariamente se tocar – mas mantendo ainda uma conexão palpável, uma energia circulante entre si. Estabelecendo um diálogo entre as artes e a ciência, mas sem o objetivo de ilustrar com a arte os caminhos científicos, o coreógrafo criou, com seus bailarinos, algoritmos (passos necessários para se realizar uma tarefa, ou um caminho a se percorrer para atingir determinado fim) de movimentos. Baseados no trabalho dos físicos do CERN, os artistas criaram diagramas (inspirados em diagramas da física) e, a partir deles, combinações de movimentos.
Utilizando-se de uma estética artística clara e nomeadamente de uma dança pós-moderna mais antiga, os seis bailarinos de Jobin (Catarina Barbosa, Ruth Childs, Susana Panadés Díaz, Bruno Cezario, Stanislas Charre e Denis Terrasse) deslocam-se pelo palco numa série de contatos e não contatos constantes. Não contatos físicos – os bailarinos nem sempre se tocam, mas estão em constante interação, ainda que a centímetros de distância, ou do outro lado do palco, mas em todo o tempo conectados através de gestos e/ou de olhares. O conjunto da obra nos dá a impressão de um grande ambiente controlado, no qual as variações são inseridas lentamente de forma a não perturbar a ordem estabelecida. E nisso talvez resida o problema com o trabalho: para os que não prezam tanto uma estética ordenada e até certo ponto previsível, seja de deslocamento ou gestual, o espetáculo talvez tenha parecido extenso ou até mesmo prolixo. De uma forma geral, o trabalho foi correto dentro do que se propôs. Apenas não trouxe grandes desafios para seus intérpretes ou mesmo para o público. E não parecia ser esse o objetivo do mesmo, em todo caso.
É preciso ainda falar sobre o sétimo bailarino em cena: a instalação luminosa cinética de Julius von Bismarck. Bismarck, artista visual alemão que também participou da residência artística no CERN, desenvolveu um sistema de iluminação controlado que gera efeitos que interagem com os intérpretes, não apenas com um belíssimo jogo de luz e sombra, mas também com a movimentação destes.
O figurino de Jean-Paul Lespagnard está de acordo com a estética do trabalho como um todo, parecendo remeter a impulsos elétricos, mas com uma inspiração mais vintage, e a música de Carla Scaletti, composta a partir de ruídos captados no próprio CERN, é o último elo em um espetáculo quase cientificamente correto, mas sem grandes surpresas.