O espetáculo Le sacre du printemps, é uma releitura da obra A sagração da primavera (1913), de Vaslav Nijinsk com música de Igor Stravinsky, e é, principalmente na música, que Xavier Le Roy se debruça para esta criação.
Baseado na movimentação do maestro ao reger a obra, Xavier posiciona-se de costas para o público como um verdadeiro maestro e, mesmo não estando vestido de smoking preto, como de costume, este se coloca no centro do palco vazio com o mesmo rigor. A música começa e, com ela, a regência daquela orquestra que habitava o imaginário de quem assistia. Cheguei até a cantarolar partes da música, embarcando nos leves movimentos realizados por Xavier bem diante de mim.
Com o desenrolar da música, ele se volta de frente para o público, e os limites entre artista e público são perdidos. Todos estão dentro do espetáculo e o público passa a ser orquestra. Não possuo grande conhecimento em música, mas acredito que naquele momento eu tocava um violino, ou algo parecido. Essa ideia pôde ser intensificada por caixas de som espalhadas pela plateia que distinguiam os sons de cada instrumento.
À medida que o trabalho acontecia, a figura do maestro ia se dissolvendo em dança. Sua movimentação crescia com a música, e ambos estavam em plena sintonia. O domínio de Xavier sobre a obra de Stravinsky era tão próprio, que a música parecia exalar de seu corpo em forma de movimento.
Apesar de essa movimentação ter apresentado variações de dinâmica, me deixou com vontade de mais. Não mais do mesmo, mas… O que ainda poderia crescer a partir do que estava sendo mostrado? O vigor com que eram apresentados e a potência desses movimentos – aparentemente – simples, diretamente associados à música, produziram um estado de constante atenção para o que estava acontecendo, e me questiono se não seria exatamente essa constante pulsação da obra – que parece não ter fim, mesmo com o seu término – o que torna o trabalho interessante. Será que esse estado de espera e de alerta é uma sensação real de quem aguarda o sinal do maestro para tocar seu instrumento?
A obra vai além de caracterizar a figura do maestro em cena, ela traduz em dança como a experiência de ser maestro reverbera no corpo de Xavier Le Roy, trazendo também para o público uma experiência nova, mostrando uma visão diferenciada da obra histórica A sagração da primavera.